quarta-feira, 16 de junho de 2010

A noite não tinha lua. Nem céu, a noite tinha. Um escuro medonho e as sombras das traições aperreavam seus passos solitários pela rua escura.  Andava como um bêbado, tropeçando nas esgueiras calçadas, entre os muros, entre as facas apontadas; era a rua tão deserta, tão gelada...
As mãos dentro do casaco, o cenho fechado, sombrio, amedrontado. E se viesse a lâmina da faca arrepiar-lhe as carnes, soltando-lhe as entranhas abaixo da calçada? Ou algum maníaco depravado  lhe arriasse as calças e usurpasse sua intimidade na obscenidade de um estupro?
Sentia um medo...lembrou-se do pesadelo da noite anterior. Tinha as mãos manchadas de tinta fresca e preocupada em não sujar os bolsos do casaco, mantinha-as bem cerradas, os pulsos apertados. Seus ossos doiam de fome e frio. Ansiava por chegar em casa, desesperada da cidade grande que apavorava. Precisava correr, mas as pernas não obedeciam. Duras, tensas,apenas caminhavam um passo lerdo, quem visse não diria seu interior tão assombrado.
M.A. era a pessoa mais solitária do mundo, com certeza. Não era uma solidão visível, era uma ferida oculta, incalculável. Seu ninho invisível. Seu pai dizia, a mãe nunca disse, não se atreveria, pois sabia que a amava, mas ela sabia que não prestava para nada. Nem para correr se viesse o ladrão em seu encalço.
A solidão era seu único remédio amargo. Hoje era dia de tomar farta dosagem.

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