quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

olga


O Temporal pegou Maca desprevenida

Sei que vou ser barrada na entrada.



Não passarei na catraca, pois a ordem é: um texto por dia. De doze em doze horas, doses homeopáticas. Não importa, vou tentar assim mesmo. É que Macabéa está cheia de urgências inusitadas principalmente devido às palavras carinhosas que escutou no metrô, na estrada.



Sim, para ela tudo ainda era estrada e chão batido.



Afora as urgências, Macabéa virou santa. Foi inscrita num livro sagrado desses que existem porraí, editados sem revisão, sem contrato assinado, pois não é verdade que ela nem sabia?



Agora quer ser estação de metrô, a Louca.



É um sonho novo, reciclado. Nem lembra mais dos sonhos do passado que foi ontem. Macabéa urgente é uma maravilha, com tudo regurgitando em dobro, a fala apressada e se comendo toda, trêmula, como uma loba no cio.



Macabé arisca, e sem sentido para comer pizza, sem o casquinho que esqueceu em casa, e a chuva já pintando de negro o céu agora há pouco azulado, corre.

Sentido contrário. Deu de cara com o sujeito que a perseguia: Macabéa...Macabéa Alice.

Não sou, não sou, dizia, enquanto apertava o passo largo de maratonista em direção ao raio que a partisse no meio da tempestade.
A Voz do Mago


Enquanto ele falava, enredando versos para me encantar, fiquei ali parada, escutando aquela voz monosilábica.



Os silencios intercalavam-se, diziam-se. Vazios.



Já era tarde.



Apenas bêbados e vagabundos famosos defloravam as ruas fétidas arrastando {como cobra pelo chão} os solenes corpos saciados.



Nos céus, as horas passavam-se diferente.



Demônios dançavam a valsa dos gonzos e cantavam hinos que amortalhavam pênis.



Viramos uma mágica - eu e ele, a sede dos defuntos, a fome dos ferozes.



Outros sons, ainda outra estrada (: talharim com frango defumado, lasanha à bolonhesa).



- Envelhecer é o pior mandato humano, disse-me sem meias palavras, sem recatos
Não serei mais libélula nem cacilda,


nem clarice,

creusa, nem doida, nem cereja.



Muito menos cabaléa, dulciléia,

nem a triste macabéa... nunca!



Serei eu e o meu sexto sentido,

gozando essa manhã mista

entre o sol e a chuva teimosa

para parecer comigo.



E serei eu de novo o dia todo,

até que a noite pouse e traga_me de volta

tantas outras que tem sido.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

VINDE BULAS

vide versos
vide cores
vide amores
vide bulas
vide tempos
e queixumes
vide dores
e tormentos
vide espamos
e tremores
e terrores
meias-noites
madrugadas...
vide espanto
e lagartas
céus, estrelas
e luares
vide a mim,
vinde...!

A Despedida de Macabéa da Mota

Não há nada, absolutamente NADA a ser feito. Estava tudo preparado, as malas feitas e refeitas trezentas e tantas vezes esperavam no corredor vazio. Alguns últimos detalhes e estaria tudo terminado. Maca lembrou-se de filme de terror, algo supérfluo como "o crime perfeito".

Sabia que deixaria rastros e sequelas -  rotinas que o tempo não abate, prestações e outras coisas guardadas em armários emprestados. Tudo bem, respirou fundo. A mala está mesmo pesada. Desapegar-se. Mais roupas fora da mala, melhorou o peso.

 Homens covardes que não tiveram a coragem de olhar de frente, perderam-na. Seu amor perdeu-a. Amor, que amor? Nunca houvera. O tempo fora gasto com a vida, com as horas passando e repassando no outro dia, ligeiras incomodações, percalços financeiros, enfim... vida!- um tremendo enfado.

De repente (não posso subtrair essa palavra) as pessoas danaram-se a fazer despedidas em sua homenagem "ah, que falta você vai fazer..." mentira. Por que não sentiram a presença, vão sentir a falta? Tomara, pensava ela lá no íntimo, tomara que sofram...mas que nada, nem vão lembrar, é assim mesmo. Talvez uma foto, uma notícia na coluna da secretaria de cultura, algo assim, um nome na lista dos emails, algum comentário "foi atrás de homem",  assim caminha a humanidade. That´s all.

"Aquela, com é mesmo o nome dela?" Fica por aí, não passa disso: um nome esquecido. Fica nisso.

Arruma-se ligeiramente com os restos da maquiagem que restou na bolsinha de plástico transparente, até que termine, depois disso, não mais, decididamente não vai mais usar maquiagem. Desapegar-se, cara limpa. É isso.

A dúvida era só a última dúvida. Era quanto ao casaquinho preto. Ao tocá-lo, sentiu uma nostalgia fina e meio cúmplice. Tinha que desapegar-se ou tingí-lo..

É isso.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Carnaval...eu, hein? Odeio.

Debaixo da mesa. Com medo. As pessoas estavam gritando e pensando alto. Tapava os ouvidos com as mãos e a toalha branca cobria todo o seu corpo. Ficou ali até de manhã, acabou dormindo debaixo da mesa e as pessoas nem deram falta dela.

Talvez fosse nova demais para aquela festa tão adulta, tão barulhenta. Resolveu que nunca mais iria ao carnaval, nem que vivesse cem anos, e sempre que lhe perguntavam: gosta de carnaval, respondia - odeio!

Passados tantos tempos, Macabéa ainda tem um trauma com relação ao carnaval, e, estranha comparação, para ela é igual à semana santa, a missa de sétimo dia, velório. Associa, pois, o carnaval a luto. Naquele dia tentaram matar o que ela tinha de festa em si.

Era mesmo metida a besta, madamezinha metida a besta. Pois não é que não gostava de multidão, de "pooovo", dizia com aquela vozinha arrastada...metida mesmo?

Um dia, depois desses anos passados, foi a um Baile da Saudade. Garantiram-lhe que não era como os outros. Seria como era. Foi. Estava lá a velha orquestra daqueles tempos, Ivanildo e seu conjunto. No começo, tudo bem, Macabéa até ensaiou uns passinhos, ficou animadinha, coisa e tal. Os foliões eram todos senhores e senhoras e dançavam daquele jeito que todo mundo sabe: com os braços arribados e os dedinhos duros mexendo-se de um lado para outro. Do jeito que era engraçado.

Deu meia-noite, porém, a bagunça começou. Estavam todos bêbados e não sabiam mais que o tempo tinha passado. Perderam a noção.  Uns e outros vieram agarrar Macabéa para levá-la ao salão, à força. Ela não queria, não foi. Ficou chata e esqueceram-na depois que ela demorou muito no banheiro. Daquela vez não poderia esconder-se debaixo da mesa, mas podia sim, pegar as chaves do carro e ir embora. Foi.

Decididamente, Macabéa não suporta carnaval. Agarrou seu casaquinho preto e correu para casa, onde estava seu carnaval: uma boa garrafa de vinho e um filme na TV. Não disse que Macabéa é besta?

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Bolo de areia

Pés descalços
A poesia
A
Descansar
Nas bordas:
Bolo mole
Mão desanda

Desandado
Todo mole
Bolo
De areia

UM DIA DE CADELA

Mordeu o menino pequeno
Castigo trancado na cozinha
Nada no chão, nem lixo.

Cachorro que late
Apanha.

Cadela.

Rosnando para a cozinheira,
Que desplante...
Apanha!

Sem comida todo o dia
Faz xixi em todos cantos,
batizando em seu próprio nome:
Bud Airton.

A mulher esbraveja, bate com a vassoura.
Mais xixi - aja!..
Cachorro fedido tome, tome.

Não posso mais assistir tais cenas
Desligo a porta e vou embora com a tv fechada
Estou sonsa de tanta pancada.