quinta-feira, 20 de maio de 2010

DISCORRENDO OS DIAS/As Incoerências de Maria Madalena/Mulheres que Não Dizem Nada

Dramas cotidianos à parte, Macabéa Alice tinha que cumprir suas obrigações de escritora de orelhas de livro, dona-de-casa, cuidadora de cachorros de patricinhas, entre outros; embarcou no seu metrô predileto e foi até à Estação São Judas, onde tinha uma conta a pagar.
Lá, numa loja enorme, confusa, amontoada, Macabéa viu coisas estranhas, a começar pelos homens estranhos e mulheres estranhos. Não conseguia encontrar uma pranchinha para comprar, até que enxergou um pequeno oásis: um cantinho para tomar café - tinha até um homem sentado, lendo um livro, naquele cantinho não tão isolado, daí ela resolveu tomar um cafezinho,. Tomou. Mas, assim mesmo, apesar da pausa, do cafezinho, não se sentiu muito bem. Ainda leu uma das cronicas do livro que sempre carregava na bolsa, no entanto nada mais lhe deu prazer. Não gostava de lojas assim, de pessoas assim estranhas. Pegou o metrô de volta. Delícia dos prazeres, não estava  tão cheio. Sentou-se na cadeira preferencial porque não tinha ninguem mias depauperada do que ela. Se chegasse alguem, faria a devida substituição - banco de reserva cedido entraria no campo. Chegou já bem tarde à Consolação, daí, desceu a Augusta, observando o movimento dos bares, restaurantes, pessoas fumando nas calçadas, papos animados.. Às vezes ela pensava que era a única solitária naquela cidade, mas já alguem lhe tinha dado garantias seguras de que eram milhares de pessoas como ela. Não se enxergava em nenhum rosto. Ultimamente aquela cidade estava aborrecida: iria embora para o Rio de Janeiro!
Lá ela ficaria uns dias na Gávea, no apartamento de uma amiga. Lá,no Rio de Janeiro, ela estaria mais perto do Chico Buarque, da Globo, do calçadão de Copacabana, da Lagoa, dos cariocas "carasdepau" e iria dançar na Lapa até o dia clarear. Aqui, tédio dos tédios, ela só encontrava a Odete Roitman. Ah, e tambem não podia deixar  de "save the date" de ir à Feira dos Paraíbas - era assim que chamava? Os repentistas, o forró, a alegria dos porteiros e das empregadas domésticas que se esbaldavam nas pequenas pistas onde a moçada e a coroada davam shows de bola de forró.

Ela era uma daquelas mulheres desprendidas, que não dizem nada, não tem nada a dizer, não fazem nada, não tem nada a fazer, não contribuem  nem influem tampouco nos destinos da Nação, da Literatura, do Sexo, da Educação, do Combabe ao Narcotráfico, não estava engajada em Nenhum Movimento, não esbravejava por Pouca Coisa, Empáfias, Litígios, Movimento dos Sem Arte e outros. Havia dado um basta á ex-fervescência de sua vida. Era uma extra-vagante agora. Mesmo porque durante a queima de arquivos lá no Araguaia ela era muito mocinha, só queria tocar violão e andar de bike, que, naquele tempo, se chamava bicicleta (já disse isso - alías -  disse tudo isso antes). Errante, podia andar de um lado para outro, embora o assunto de arrumar malas realmente continuasse sendo um grande problema. Alguns só levam a moedinha da sorte, outros levam roupas de inverno, verão, primavera e outuno para usar por dentro, agasalhar, deixar voar, levar à praia, esbaldar, descansar - tudo à pobre alma estressada, outros, ainda, levam grandes malas que assustam os anfitriões e alegram os gerentes de hotel, e outros como a comadre de Macabéa que leva uma pasta do tipo 007 e nenhum segredo, só levam o corpo praticamente, ainda ensinou que só viaja de saia, porque é um aperto - literalmente, abaixar as calças jeans naquele banheirinho de avião. Macabéa não. Macabéa levava muuuuuuita coisa, e nunca era suficiente - oh My God, por que não trouxe o vestidinho preto? O básico. Os livros não podia esquecer -  atualmente estava lendo alem da Biblia, Confissões de J. Peste.

Depois, quem sabe? - poderia fazer uma excursão ao Pais das Navalhas, revisitar o Deserto de Atacama para rever as longas areais ou ficar mesmo só em frente ao seu Espelho Deformado.

Nenhum comentário: